segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

V - Origem e Evolução das Confrarias


Destaque para o papel das Confrarias Báquicas no enaltecimento e valorização do vinho

(Continuação do anterior)

Por: João Carvalho Ghira *

Só mais de uma década passada surge outra confraria, tendo-se nos últimos anos assistido então a uma sã proliferação deste tipo de associação, a última das quais, creio que a 12ª, foi na ilha Terceira a Confraria do Vinho Verdelho dos Biscoitos.

Enquanto umas estão directamente ligadas a uma região produtora, a uma determinada denominação outras abarcam a generalidade do bom Vinho português e outras ainda retomam o princípio da exclusividade profissional dos confrades como é o caso da dos Jornalistas Enófilos.

É inegável que o ressurgimento das confrarias, particularmente nos moldes actuais, se pode revelar de manifesta acção em favor do Vinho. Numa época em que cada vez mais forte é a concorrência de outras bebidas sucedâneas, este movimento poderá ter um papel preponderante para a manutenção da civilização do Vinho.

Passados que foram os tempos em que a tónica assentava na quantidade, em que à pergunta de branco ou tinto e resposta era muito, em que importava consumir bastante porque “beber vinho era dar de comer a um milhão de portugueses”, assistiu-se nos tempos mais próximos a uma redução considerável de consumo, por vezes como única alternativa ao cumprimento de disposições legais vigentes em que o Vinho será o grande lesado, mas simultaneamente a uma aprofundamento dos conhecimentos, seja do que se bebe, seja particularmente de como se bebe. O interesse em se conhecer a origem, o poder-se aprofundar-se e apreciar individualmente ou discutir em grupo as características do néctar adequado ao momento, a forma como ele foi apreciado, qualificado ou classificado por outros, começou a entrar na rotina daqueles que ao vinho dedicam uma particular atenção, direi mesmo uma devoção.

Se os clubes de vinho, se as tertúlias báquicas poderão aqui desempenhar um papel de ajuda aos adeptos desta causa, não há dúvida que as confrarias báquicas potenciarão todo este movimento, conferindo-lhe a possibilidade de conciliação do aspecto cultural com o social, o técnico e consequentemente também o económico, resultado de um enaltecimento da qualidade, da difusão dos vinhos que respondem positivamente a este quesito e do incentivo a um consumo regular e moderado, esclarecido. Contribuindo decididamente para aquela campanha que o prestigiado técnico e enófilo Artur Pinho, em obra publicada recentemente, considera uma campanha de concretização imprescindível e urgente, visando a elucidação das vantagens higiénicas, sociais e civilizacionais do consumo moderado e exigente do vinho de qualidade, tanto quanto possível personalizado e da autêntica responsabilidade de quem o produz e ou comercializa.

Se as confrarias actuais se inspiram em tempos antigos será para não deixar romper a ligação que nos une ao passado. Respeito filial, nostalgia de história, gratidão pelos legados de virtudes morais da nossa civilização latina. Também hoje, citando Louis Orizet, no prefácio do “Le Grand Livre des Confréries des Vins de France” pelos fundamentos secretos dos seus estatutos elas querem-se moralizadoras, humanas, justiceiras e filosofas.



E se a forma estatutária de expressão é diversa, os propósitos são idênticos. Na generalidade, as nossas confrarias báquicas defendem o vinho e os consumidores, fazem a apologia da qualidade e propõem-se divulgar a excelência de uma bebida que, já foi dos deuses e será sempre dos homens que desejam ser como deuses: senhores da sabedoria, donos do amor, amigos uns dos outros.

* Alocução proferida pelo Grão Mestre da Colegiada dos Enófilos de São Vicente, na II Festa da Vinha e do Vinho dos Biscoitos - Ilha Terceira – Açores.

Texto publicado na Revista de Vinhos ano 1993

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