segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Revoluções: provérbios e pensamentos (2)

(o anterior aqui)



-Nas revoluções, como nas guerras civis, os homens acham-se desterrados na sua própria pátria.

- As revoluções, quando não melhoram, deterioram necessariamente a sorte das nações.

-As revoluções embranquecem muitas cabeças, sem as terem amadurecido.

- As revoluções são como Saturno; devoram seus próprios filhos.

- As revoluções são como tufões; derribam e cegam outros com a poeira que levantam.

- Uma revolução é um baptismo de lágrimas e de sangue.

- Acontece nas revoluções o mesmo que nas lotarias; a perda é de muitos, e o ganho de poucos.

- Nas revoluções há duas espécies de pessoas, as que as fazem, e as que delas se aproveitam.

- Os que fazem as revoluções são, pela maior parte, os que agitam e turvam as águas, para outros pescarem nelas.

- O fruto das revoluções quase nunca o colhe quem as excita.

- As revoluções liberais trazem ordinariamente consigo a liberdade de direito, e a tirania de facto.

- As revoluções, agitando as sociedades, fazem sempre subir algum lodo à superfície.

- Na fermentação dos povos, como na dos licores, as escumas sobrenadam e ficam de cima, até que descem ou se evaporam.

 - De todas as revoluções, as mais perigosas são as restaurações.

- Os autores das revoluções espantam-se, quando passando por diante da sua obra, observam o que têm feito.

- Os crimes fecundam as revoluções, e lhes dão posterioridade.

- Nas revoluções vêem-se brilhar um instante sobre o horizonte, e desaparecer, como meteoros, homens que se julgavam astros.

- As revoluções operam estranhas metamorfoses: os mesmos homens são nelas alternadamente vulgo e potentados.


domingo, 27 de fevereiro de 2011

Garrafa em grés vulcânico


Garrafa em grés vulcânico (cerâmica feita com barro vulcânico, pedra pomes e caulino, cozida a 1200ºC, cujo vidrado é composto de pó de pedra e cinza de madeira) pelo artista Renato Costa e Silva, que assina e numera cada peça. 

As 100 garrafas, editadas pela Casa Agrícola Brum em 1995, foram cheias com um generoso Verdelho dos Biscoitos, colheita de 1991, comemoram “Um Vinho na Rota dos Descobrimentos Portugueses”. O formato foi inspirado nas garrafas daquela época. 

sábado, 26 de fevereiro de 2011

Edução e cultura, sempre!



A Escola Primária da Ladeira da Pena começou a funcionar num imóvel adquirido pela Junta Geral do Distrito de Angra do Heroísmo em 1930, como recorda uma placa no frontispício: “Edifício adquirido pelo Governo da Ditadura Nacional/1930”.

O sismo de 1 de Janeiro de 1980 deixou-o inoperativo. 

Com a concentração dos alunos na (nova) Escola Irmãos Goulart (que alberga uma creche, jardim de infância e 1º ciclo) os outros três estabelecimentos de ensino das Fontinhas foram doados pela Câmara Municipal da Praia da Vitória a instituições da freguesia: a Escola da Fontinha ao Agrupamento 642 dos Escuteiros das Fontinhas; a Escola do Areeiro à Junta de Freguesia para adaptação a habitações sociais e a Escola da Ladeira da Pena ao Grupo Folclórico "Fontes da Nossa Ilha".


sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

O Verdelho dos Biscoitos e a sua técnica cultural (2)




Por: João Madruga*

(continuação do anterior)

SISTEMA DE CULTURA TRADICIONAL


A vinha ocupa os solos com fraca aptidão cultural, sendo na sua maioria Litossolos e Solos Litólicos, caracterizados por serem solos pouco espessos, com reduzida capacidade de retenção de humidade, derivados da alteração de materiais consolidados, em especial materiais escoreáceos e derrames lávicos.

Quando os solos são pouco evoluídos (Litossolos), abrem-se covas nas fendas dos derrames lávicos, covas estas onde se procede à plantação dos bacelos. Nos solos mais evoluídos (Solos Litólicos), a sua elevada pedregosidade dificulta as surribas, ou viradas, as quais são feitas durante o Inverno, a uma profundidade que varia entre os 0,60m e 1m, operação esta que está praticamente a ser abandonada.

Na zona dos «Biscoitos» recorreu-se, também, ao uso de solos mais evoluídos, aos quais após a sua cobertura com material pedregoso (empedramento), numa espessura variável entre os 20 e os 50cm, se faz a plantação dos bacelos em caldeiras ou covas de forma circular, com diâmetro médio à volta dos 70cm. A época de plantação vai desde Novembro até Março, sendo os bacelos plantados preferencialmente do lado Norte da cova. O compasso de plantação é algo irregular apresentando, contudo, uma geometria dominante.


O sistema de condução mais usado neste tipo de vinha é em forma livre, com um tronco curto, (20 a 30cm), cujos braços, em número variável, se encontram distribuídos em todos os sentidos sobre o empedrado. Aplica-se a técnica de poda em vara e talão.
Este tipo de viticultura enquadra-se na concepção do tipo grego (Castro, 1989), caracterizada por "vinha baixa com as cepas livres" com grande intervenção humana, especialmente na colocação de "estacas", "tinchão" ou mesmo pedras, com a finalidade de proceder ao levantamento das varas em produção.

Os terrenos de vinhas, formados por uma ou mais parcelas, são divididas no sentido do seu maior comprimento em «tornas», e estas subdivididas em curraletas, ou currais. As delimitações entre parcelas, tornas e curraletas são feitas à base de muros de pedra (as «travessas»), com espessura variável em função da quantidade e qualidade da pedra disponível. Como se pode compreender, este sistema cultural recorre ao uso de muita mão-de-obra, sendo difícil, ou quase impossível, a sua mecanização. Cada curraleta comporta um número variável de cepas, número este que é condicionado pela respectiva área e fisiografia. A vinha fica como que "enterrada" na curraleta, ao abrigo dos ventos marítimos, principalmente graças ao efeito das travessas (Amaral, 1994).


Uvas sobre biscoitos de lava

Como já foi anteriormente referido no respeitante aos solos, as curraletas, quando pedologicamente não são constituídas por Litossolos ou Solos Litólicos, são geralmente cobertas com material pedregoso, cujo objectivo se prende, não só com a arrumação da pedra, mas sobretudo com a finalidade de proporcionar um microclima, mais favorável.
Segundo Brum, (1994), a pedra sobrante das viradas era muitas vezes colocada em torreões, que serviam para o feitor, ou o homem mais experiente, controlar melhor os trabalhos culturais.

Referências Bibliográficas:

Amaral, J. D. (1994) – O Grande Livro do Vinho. Edição Círculo dos Leitores, 415 p.
Brum. L.M.M. (1994) – Comunicação apresentada no 1º Encontro das Instituições Museologias dos Açores. Ponta Delgada. Março.
Castro, R. (1989) – Sistemas de condução da vinha. Evolução, tendências actuais e estudos a decorrer em Portugal. Ciência Téc. Vitiv. 8 (1-2) : 37-54.
Champagnol, F. (1984) – Physiologie de la Vigne et de Viticulture Generale 331 p. 

* Professor do Departamento de Ciências Agrárias da Universidade dos Açores e Vice Grão-mestre da Confraria do Vinho Verdelho dos Biscoitos

In Revista Verdelho  n.º 1 – ano 1996 – órgão informativo e cultural da Confraria do Vinho Verdelho dos Biscoitos



Outros :

Os Biscoitos : História e Origem (1482 - 1556) aqui 

Planta da Freguesia dos Biscoitos (ano 1830) aqui

Plantas Vasculares nas Vinhas dos Biscoitos (ano 1971) aqui.

"A vinha perde-se e a população nada ganha" (ano 1994) aqui.

"Região de Biscoitos, nos Açores - Casas em vez de vinhas" - Santos Mota (ano 1994) - aqui.

"Biscoitos: que futuro? "-José Aurélio Almeida (ano 1996) - aqui.

"As Vinha dos Biscoitos" -Bailinho de Carnaval da Freguesia das Fontinhas. (ano 1997) aqui.

"Uma virada nos Biscoitos"(Açores)- (ano 1998) aqui.

"Os Biscoitos, as vinhas e o desenvolvimento rural" - Joaquim Pires (ano 1998) aqui.

O viticultor açoriano está envelhecido (ano 1998/99) aqui

“Provedor de Justiça dá razão à Confraria” (ano 1999) aqui.

“Museologia de Interpretação da Paisagem Ecomuseu dos Biscoitos, da ilha Terceira” - por Fernando Santos Pessoa (ano de 2001) aqui.

"Carta de risco geológico da Terceira" (ano ano 2001) aqui.

"Paisagem Báquica - Memória e Identidade" - Aurora Carapinha (ano 2001) aqui.

“A Paisagem Açoriana dos Biscoitos” - por Gonçalo Ribeiro Telles (ano 2002) aqui.

"Fadiga sensorial" (ano 2007) aqui.

"Defender curraletas!" (ano 2007) aqui.

"Rememorando as origens dos Biscoitos nos séculos XV e XVI"- por Rute Dias Gregório (ano 2008) aquiaqui e aqui.


“A Vinha, o Vinho dos Biscoitos e o Turismo” - por Margarida Pessoa Pires (ano 2009) aqui.


(continua)

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

O Verdelho dos Biscoitos e a sua técnica cultural


Por: João Madruga*

Grande parte das vinhas da Zona Vitivinícola dos Biscoitos encontra-se instalada em zonas relativamente jovens, formada na sua grande maioria por derrames lávicos e escórias vulcânicas, sendo designadas localmente por «lajidos» e «biscoito», respectivamente.

Um emaranhado de travessas (muros de perda solta) formando as curraletas  

Nos Biscoitos a vinha encontra-se instalada em duas situações distintas, e, obviamente, em dois tipos de solos. Predominam os solos de «biscoito», incluindo na sua maioria Litossolos e Solos Litólicos. 
Apesar de se tratarem de solos muito incipientes, as covas onde se encontram plantadas as cepas apresentam um teor relativamente elevado em matéria orgânica. O PH é ácido, pelo que se justificaria uma correcção mineral. De referir que é prática corrente a sideração à base de tremoço.



No que se refere ao P, apresentam valores elevados (no método de Olsen 20ppm representa um valor médio), pelo que a aplicação deste nutriente não requer grandes cuidados. A adubação potássica não deve ser descurada, apesar dos teores elevados, pois como sabemos, este elemento desempenha um papel importante na fisiologia da videira.

Em relação às adubações azotadas, devemos ter presente que, quando em excesso, podem originar graves danos, especialmente quando não acompanhadas com adubações equilibradas de outros nutrientes, nomeadamente o K (Champagnol, F., 1984)

Continua


Outros :

Os Biscoitos : História e Origem (1482 - 1556) aqui 

Planta da Freguesia dos Biscoitos (ano 1830) aqui

Plantas Vasculares nas Vinhas dos Biscoitos (ano 1971) aqui.

"A vinha perde-se e a população nada ganha" (ano 1994) aqui.

"Região de Biscoitos, nos Açores - Casas em vez de vinhas" - Santos Mota (ano 1994) - aqui.

"Biscoitos: que futuro? "-José Aurélio Almeida (ano 1996) - aqui.

"As Vinha dos Biscoitos" -Bailinho de Carnaval da Freguesia das Fontinhas. (ano 1997) aqui.

"Uma virada nos Biscoitos"(Açores)- (ano 1998) aqui.

"Os Biscoitos, as vinhas e o desenvolvimento rural" - Joaquim Pires (ano 1998) aqui.

O viticultor açoriano está envelhecido (ano 1998/99) aqui

“Provedor de Justiça dá razão à Confraria” (ano 1999) aqui.

“Museologia de Interpretação da Paisagem Ecomuseu dos Biscoitos, da ilha Terceira” - por Fernando Santos Pessoa (ano de 2001) aqui.

"Carta de risco geológico da Terceira" (ano ano 2001) aqui.

"Paisagem Báquica - Memória e Identidade" - Aurora Carapinha (ano 2001) aqui.

“A Paisagem Açoriana dos Biscoitos” - por Gonçalo Ribeiro Telles (ano 2002) aqui.

"Fadiga sensorial" (ano 2007) aqui.

"Defender curraletas!" (ano 2007) aqui.

"Rememorando as origens dos Biscoitos nos séculos XV e XVI"- por Rute Dias Gregório (ano 2008) aquiaqui e aqui.


“A Vinha, o Vinho dos Biscoitos e o Turismo” - por Margarida Pessoa Pires (ano 2009) aqui.


(continua)


quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Seminário: "Vitivinicultura Atlântica - Construir o Futuro"



A Cooperativa Vitivinícola da Ilha do Pico CRL leva a efeito, na Vila da Madalena, nos dias 10 e 11 de Junho pf, um seminário rotulado: “Vitivinicultura Atlântica - construir o futuro”, evento integrado no cinquentenário daquela prestigiada instituição. 

Principais Objectivos 

- Identificar temas de interesse comum, que possam ser desenvolvidos em parceria

- Aprofundar as parcerias já existentes, nomeadamente através dos projectos INTERREG;

- Reconhecer, valorizar e promover um património vitivinícola único no Mundo;

- Definir uma estratégia conjunta para o enoturismo;

- Perspectivar o futuro dos vinhos atlânticos.


Temas a abordar

Tendo em conta os objectivos enunciados, o Seminário está estruturado em quatro temas relacionados com a imagem, promoção, produção e comercialização dos vinhos atlânticos:
- Património Vitivinícola das Ilhas Atlânticas;

- História e Tradições na Produção de Vinho;

- Viticultura e Sanidade da Videira;

- Vinhos Atlânticos, Enoturismo e Gastronomia.

Prazos

Inscrição e apresentação dos resumos das comunicações (máximo 1 página A4): 31 de Março de 2011;
Envio de textos definitivos das comunicações para distribuição no início do Seminário: 31 de Maio de 2011.

 O programa, técnico e científico, contará com conferências de especialistas convidados dos arquipélagos das Canárias, Madeira, Açores e outros de outros países.

Contacto: 

Cooperativa Vitivinícola da Ilha do Pico C.R.L.
Av. Padre Nunes da Rosa, n.º 29 – 
9950-302 Madalena (Pico)  

Telefone: 292622262; Fax: 292623346.

terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

União das Federações: Vantagens e Inconvenientes


Por: José Manuel Costa e Oliveira*

Gostaria de, na pessoa de V. Ex.ª Senhor Grão – Mestre da Confraria do Vinho Verdelho dos Biscoitos, cumprimentar todos os participantes do I Simpósio das Confrarias Báquicas e Gastronómicas de Portugal e transmitir o meu pesar por não poder participar pessoalmente. 



Aconteceu, como na altura da aceitação do convite não me lembrei que a minha actividade politica fica normalmente afecta ao período de comemoração que, nos presentes dias atravessa o nosso país, foi com pena que não marquei presença física.

Porém, aceitei a disponibilidade e amabilidade do nosso Ilustre Grão-mestre para, saudar todas as senhoras e senhores e, também, pedir a todos vós que escutem, embora de forma reduzida, uma ou outra reflexão que, nesta ocasião, pretendia abordar convosco.

Pedem-me, o que aceito com gosto, para falar sobre a União das Federações: Vantagens e Inconvenientes. Vejamos então:

Falar de união, seja do que for, merece, à partida, a aprovação e, mesmo entusiasmo, seja de quem for. É natural e, até vários provérbios ilustrariam esta verdade sendo que, o mais popular é aquele que nos diz que a “união faz a força”.

Penso, até que a principal causa de algum reconhecimento atraso no nosso sector agrícola, tem a ver com isso mesmo, ou seja, a evidente incapacidade de fazermos muitas mais coisas em conjunto.

Quem, como muitos de nós, acompanhou os primeiros passos do nosso País na sua adesão à Europa Comunitária, decerto notou o que nos distanciava dos outros parceiros, todos eles mais evoluídos do que os portugueses. De entre tudo o mais, a realidade do Associativismo estabelecia uma enorme diferença, ao ponto de se constatar que, em Portugal, se davam os primeiros passos na matéria enquanto que, outros, levavam dezenas de anos de prática de fazerem coisas em conjunto.

De facto, este aspecto ditou, dita e, infelizmente, ditará uma muito grande diferença.

Neste contexto, a actividade da Vinha e do Vinho poderá salientar-se, pela positiva. Reconheçam-se, quer na produção quer na comercialização, organizações dos diversos interventores na fileira, que asseguram o associativismo e cooperativismo, ou seja, que asseguram a defesa dos interesses sócio-profissionais e económicos deste sector.

Logicamente, esta mais valia, que tenho gosto em salientar, reporta-se, de forma mais clara, ao contexto nacional pois se, como também devemos analisar num quadro internacional então, com a mesma sinceridade, devemos reconhecer o muito caminho que ainda teremos que percorrer.

Nesta reflexão, o Vinho e a Gastronomia têm um lugar de honra. De facto, as denominadas Confrarias vêm desempenhando um papel de relevo, defendendo os interesses deste tão importante património nacional, assumido a sua defesa e valorizando-o da forma que ele bem merece.

De maneira claramente evidente, ambos estes sectores devem fazer um trabalho em conjunto.

Pensar em Vinho sem Gastronomia e vice-versa, será contrariar aquela que deve ser uma união natural. Na realidade, beber sem comer e comer sem beber, não faz sentido. Mais, defender e pugnar por um sem o outro, será atitude que poderá sair cara pois, tudo o que não seja um consumo inserido em dieta alimentar equilibrada, constituirá erro difícil de reparar.

Por tudo isto, se saúda este Simpósio do qual, permita-se-me a opinião, deverá sair uma organização forte, Federação ou qualquer outra instituição de grau superior que, cada vez mais, defenda os interesses do Vinho e da Gastronomia Portugueses. 

* Secretário-geral da Fenadegas e Deputado à Assembleia da República.
 I Simpósio das Confrarias Báquicas e Gastronómicas de Portugal -  Angra do Heroísmo

In Revista Verdelho - órgão informativo e cultural da Confraria do Vinho Verdelho dos Biscoitos, ano 2004


segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

domingo, 20 de fevereiro de 2011

“A especificidade do vinho açoriano inserido nas zonas classificadas ou protegidas” (2)


(continuação do anterior)

Por: António Mesquita Montes*


A Confraria dos Enófilos da  Região Demarcada do Douro durante uma visita efectuada à ilha de São Miguel

E, tal como Portovenere Cinque Terre, o Alto Douro Vinhateiros, ou o Pico, podem invocar a dimensão milenar da transformação de uma deserto povoado de fragas e arbustos em “pais Vinhateiro” intenso e pujante.

Quem lê, Tomaz Duarte Júnior que atrás já citei, fica com a exacta noção do que foi a epopeia desta viticultura no tempo, nos métodos usados da viticultura e na vinicultura, na terminologia nela usada, nas dependências dos agricultores, etc., e não pode deixar de reconhecer –lhe uma perfeita paridade com as Denominações de Origem Históricas, sejam elas as nacionais do Porto, do Dão, dos Verdes e da Madeira, ou ainda do Rioja ou do xerez, de Bordéus, da Borgonha, do Champanhe ou do Cognac, do Barolo, do Chianti ou do Tokay.

Como dizia Braga da Cruz sobre a classificação do Douro como Património Mundial, “… querer afirmar que Vale do Douro tem futuro e que o exigente processo em que envolveu tantas vontades, tem um propósito claro: ser um acto de homenagem, mas sobretudo de justiça. De homenagem a todos aqueles que, durante anos e anos, contribuíram com o seu esforço para o domínio de factores naturais adversos, talhando a majestosa escultura da paisagem duriense. Mas, também um acto de justiça, poder vir a ser um forte impulso para aumentar a expectativa e a esperança daqueles que aí persistem viver e fazer projectos de futuro”.

Da mesma forma que aqui, no Pico, diz-nos Tomaz Duarte e com toda a justiça, “…h+a também uma homenagem muitíssimo legítima a tantos ignorados heróis responsáveis pela nossa mais característica existencialidade; gerações e gerações de camponeses que a poder de braço gravaram uma epopeia quase sem paralelo, ao arquitectar no basalto uma contínua e interminável teia de “canadas” e “currais” onde florescia o “verdelho”.

“Para cultivar mais de 120 quilómetros quadrados de vinhedos, abrigados com paredes, quebrar a pedra, cavar o chão, plantar a vinha, isso foi um trabalho prodigioso”.

É Ricardo Manuel Madruga da Costa que nos diz ainda que “principalmente nos séculos XVIII e XIX, constatamos que o “verdelho” abriu estas ilhas ao circuito mais alargado da economia atlântica, derramando a parte maior dos seus benefícios muito para além dos protagonistas mais próximos da fonte de onde brotava o apreciado vinho “ilha montanha”. De facto, aos homens que o arrancavam das pedras calcinadas do rugoso e labiríntico reticulado dos vinhedos que se espraiam a perder de vista ao longo da faixa da costa rendilhada da “fronteira” ficava reservado o simples jornal para mitigar a sua miséria honrada. E, mesmo assim, só quando o ano era de feição e a colheita permitia augurar boa venda e exportação, capazes de compensar o que sobrava da cobrança do famigerado “subsidio literário” – essa invenção pombalina a favor da instrução de uma mocidade que nesta ilha nunca colheu dela os apregoados benefícios – ou da mais da mais onerosa arrecadação do “dízimo” que iria, muitas vezes, engrossar as fazendas daqueles que, pela intermediação, eram igualmente os bafejados da sorte. Viam, assim, os seus ganhos empolados pelos chorudos lucros do negócio da exportação de vinho, após ser enriquecido e “estufado” nos armazéns da vizinha Horta”.

Desta saga do “verdelho do Pico” cheia de equívocos de naturalidade – a quem o oídio em 1852 e logo depois a filoxera, pôs termo de forma dramática – ficaram as ruínas dos solares e, sobretudo, ficou uma paisagem que nos Açores constituiu o testemunho mais extraordinário do longo processo de humanização destas ilhas. Verdadeiramente peça escultórica, qual obra colectiva de elaboração secular burilada por mãos rudes e calosas, o manto negro da lava em intrincado estendal de quadriculas que se alonga do Lajido a S. Mateus e que a vinha rabisca em tons de verde, constitui notável património e assinala o contributo singular do Homem do Pico na edificação da civilização lusa nesta parte do Atlântico”.

Sob o manto de matos e silvas que vão paulatinamente encobrindo a “paisagem dos muros negros” esconde-se uma das nossas maravilhas a que a presença insólita do “maroiços”, despontando no relevo das encostas atapetadas de verde bravio, empresta tonalidades de mistério com ressonâncias de religiosidade oculta ou rituais herdados de perdidas civilizações.

Não podemos, nós hoje aqui, deixar de partilhar o voto de Tomaz Duarte quando nos diz, “ainda restam alguns, poucos, da “velha guarda”, mas muitíssimo se perdeu do encanto da qualidade de vida da “paisagem cultural” da Vinha do Pico.

Bem no fundo, custa a assistir a tanto abandono e ruína, mas somos dos que acreditam em melhores dias”.


Currais com vinha na ilha do Pico

Como já uma vez disse, aquando da criação da Confraria do Pico, o impasse recentemente criado à candidatura da Paisagem da Cultura da Vinha da Ilha do Pico de que a imprensa fez eco, não me restam duvidas, não será mais do que um acidente de percurso; reformulada a candidatura, que, argumentos adicionais não faltarão, e desde que haja vontade politica, não pode a Humanidade deixar de reconhecer-lhe toda a legitimidade para a ostentação de tal galardão. Que só por si, cuidado, não será. Jamais, a “varinha de condão” que tudo vai transformar, nem muito menos poderá ser um produto da “feira de vaidades”, em que a nossa sociedade é por vezes fértil e de alguns apenas procuram tirar proveito próprio; ser Património Mundial não é, em si, um fim, mas apenas e só um meio posto à disposição dos Homens, de homenagem às gerações passadas e ainda para, “com sabedoria e criatividade o picoense triunfar perante as adversidades da natureza, transformando pedra improdutiva no seu modo de sustento, plantando a vinha e protegendo – a dos ventos fortes do rossio do mar, preservando os currais.

Valerá a pena, penso eu, criar ainda mais algumas sinergias a acrescentar a tudo quanto já existe e, para isso, não posso deixar de sugerir, a mais valia que sempre poderia ser importante, da criação de uma Rota do Vinho com a sua Associação de Aderentes, instrumento inovador já em uso em outras Regiões, como forma de dinamizar o enoturismo, ele próprio gerador, por um lado, de receitas extraordinárias, importantes para os viticultores e, para além disso, instrumento de peso para a recuperação e adaptação de todo o vasto património arquitectónico rural que urge preservar.

Finalmente, torna-se ainda essencial conseguir o crescente envolvimento da sociedade civil, através da criação de associações de direito privado que respaldem o empenho publico e sejam a expressão da consciência cívica do Projecto no tempo.

Foi esse o espírito que aqui nos trouxe, o de total solidariedade com a Viticultura Açoriana credora do maior respeito e admiração da Humanidade e é com ele que queremos partir, deixando a estes viticultores dos Açores a certeza de que connosco podem contar.

*Grão-mestre da Confraria da Região Demarcada do Douro.

Congresso de Confrarias Báquicas e Gastronómicas – Centro Cultural e de Congressos de Angra do Heroísmo, ilha Terceira, Abril de 2004.

In Revista Verdelho – órgão informativo e cultural da Confraria do Vinho de Verdelho dos Biscoitos. 


sábado, 19 de fevereiro de 2011

UNIÃO – Provérbios e Pensamentos


- A união é força, como a divisão é fraqueza.

- A conformidade de sentimentos une mais os homens que o dever; porque o gosto e a inclinação tem nos corações mais império que a razão.

- Para o homem e a mulher sensíveis não há prazeres, que igualem os da doce intimidade de uma união.

- Todo o mundo é pela a união; mas quantos se apresentam para lhe darem a mão?

- Vós, que presidis aos destinos dos povos, tratai de os ter sempre unidos. A desunião afugenta a prosperidade; e o campo, lavrado pelas facções, não produz senão abrolhos.


sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

“A especificidade do vinho açoriano inserido nas zonas classificadas ou protegidas”


Por: António Mesquita Montes*


António Mesquita Montes

Prendem-me ao Pico e aos Biscoitos (ilha Terceira), a mim que venho do Douro, laços de muita amizade que prezo como valor sagrado não só de pessoas, mas ainda de regiões que perseguem, de há muito, a sua sina de sobreviverem de uma viticultura já reconhecida como heróica, forma ímpar que encontrámos, nós lá e vós aqui, de desbravar a Natureza, fazendo terra de simples rocha que ela nos deu, numa simbiose perfeita de a ela acrescentarmos paisagens ímpares, muita beleza e ainda o prazer de nos deliciarmos com néctares divinos.

Darmos, todos nós, o nosso melhor contributo na defesa destas vitiviniculturas é lema central de qualquer das nossas Confrarias e também por isso aqui estamos.

Pelo vinho que a elas produzem, “fruto da videira e do trabalho do homem”, com que nos altares se consagra Deus e, às nossas mesas, se estreitam os laços de amizade já feitos ou que ali, com Ele presente, se passam a partilhar.

Mas ainda pelos homens, os viticultores, rudes por natureza, mas que com o seu suor e quanto sacrifício que se renova ano após ano, numa sequência interminável de décadas das suas vidas, têm vindo a transmitir, de geração em geração, a cultura da vinha.

Este excerto de António Barreto conta-nos, bem melhor que eu próprio, a epopeia dos Viticultores: “Galgaram montes, quebraram a rocha, fizeram a terra, levantaram muros, seleccionaram castas, plantaram videiras. Sofreram o oídio, a filoxera, o míldio e a maromba, reconheceram tudo várias vezes…

Trataram das vides melhor que das próprias vidas. Trataram das videiras como trataram os filhos e as adegas como se fossem as suas casas. Podaram, enxertaram, cavaram e escavaram, redraram e nunca um desses trabalhos foi simples ou fácil. Vindimaram a cantar, para esquecer o cansaço…levaram as uvas às costas, em cestos de quatro ou cinco arrobas em sítios onde não vão carros de bois, onde se desce para o precipício e se sobe para o inferno. À noite pisaram as uvas, cortaram lagaradas, num dos mais violentos trabalhos de toda a agricultura que os álbuns de turismo ou os citadinos filhos de proprietários acham tão pitoresco, mas que só se aguenta porque é preciso viver, porque uma posta de bacalhau cru e um caneco de aguardente aquecem o corpo e porque as mulheres, em frente dos lagares, aquecem as almas”.

Aqui nos Açores, tal como no Douro, bem se pode dizer desta viticultura que ela não é tanto uma actividade económica, mas muito mais o resultado da tradição e da cultura de um povo que herdou dos seus antepassados a obrigação de legar aos seus descendentes um Património que é o orgulho desta Região.

Com quanto sacrifício e tão pouco proveito meu Deus, bem patente neste pequenino excerto que vos vou ler: “… enquanto de vindimava não se abandonava um único bago que escorregasse do cesto, tal como de coisa sagrada se tratasse, com os dedos calosos ia-se-lhe no encalço… Conta-se mesmo de Custódio, a quem um bago de uva lhe caiu numa abertura no cimo de um través que ficou a vê-lo e foi tirando pedra atrás de pedra para o apanhar, enquanto o bago mais rolava para o seu interior, o Custódio desmanchou o “través” todo, mas recuperou o bago – não desistir, é apanágio do Homem do Pico”.


Currais de vinha na ilha do Pico

“Em volta de um grande vinho – e o nosso “verdelho” é indubitavelmente um deles – tece-se uma certa mística como se a sua qualidade de excepção não pudesse resultar apenas das práticas corrente postas no seu nascimento e percurso vital”.

“E se é certo que o vinho tem alma, a do “Pico” emana com certeza da madre do seu vulcão”.

“Ver brotar as cepas da lava faz pensar em algo de mágico ou milagroso e só se sente a invulgar classe das uvas quando se desvenda o segredo da sua apuradíssima maturação que a mesma lava propicia”.

“Um vinho desta categoria não foi criado parta bebedores, mas sim para entendidos e, como tal, terá a sua perenidade assegurada, porque a raridade não tem preço.

Daqui se poderia dizer, como Bianchi de Aguiar disse do Douro, “a candidatura da paisagem cultural evolutiva viva…evidencia três aspectos principais: o carácter único desta relação numa situação de escassez dos elementos naturais – água, solo e o território acidentado; o carácter sábio desta relação resultante de um conhecimento profundo das culturas mediterrânicas e da sua adaptação *a escassez e adversidade dos elementos naturais onde a vinha é a cultura por excelência; e a diversidade da arquitectura vernacular”.

(continua)

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Antes e Agora (2)


(O anterior aqui)





Rua de S. João -
Angra do Heroísmo

























quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

«DE RE VINICA» (UM EX-LIBRIS DE LIVRARIA BÁQUICA)


Por: João Afonso *

O interesse açoriano, designadamente angrense, pelo ex-librismo abrange cultores assaz informados e que se vão internando, esclarecidamente, na tão exigente área de apreço temático e artístico que é a dos ex-líbris. Em resumo: há quem cultive entre nós, tal como no país e além fronteiras, essa curiosidade de subida expressão.

Pode, de momento, ser lembrada uma série das várias exposições de época recente no átrio superior da casa da Câmara desta cidade que assumiram evidencia de um promotor, por sinal membro da Confraria que publica este boletim. Jácome Augusto Paim de Bruges Bettencourt. O seu coleccionismo insistente é reconhecido…universalmente.

Em qualquer livraria particular ou pública que dedique atenção aos ex-líbris para valorização de todas ou das principais espécies impressas suas. E não apenas as impressas, o pequeno “ex-líbris” atinge significações várias, uma das quais está bem próxima do que se denomina bom gosto. Entretanto, dispor de um manual ou de obra mais elaborada de ex-librismo torna-se instrumento de competência abrangente de informação rigorosa, pois que «passar como gato sobre brasas» é manifestamente insuficiente tal como se verifica quer aqui quer lá por fora em milhentas publicações, umas tantas – é certo – até aparentemente bonitas mas de somenos conteúdo.


Ex- libris xilografiat de re vinica, realizat Cap al 1955, per António Gelabert i Casas (1911-1980) per a Rafael Masó

Não é o caso de recente obra intitulada – a edição foi impressa em catalão – Ex- Líbris de la proprietat dels llibres, obra de Francesc Orenes, Arola Editores, Barcelona, 2000, 345 p. il. O seu preço é o do que vale por si um trabalho de acumulado tempo laborioso.

Francesc Orenes apresenta a sua extensa, selecta colecção de dezenas de espécies, algumas tão antigas quanto de tempos ”clássicos”, medievos, outras modernas assinadas por artistas autores.

O que trago para esta revista – excelente – da Confraria constitui curiosidade aparte porque se relaciona com a res vinica no seu latim que, facilmente aliás, se traduz: coisa de vinho e da vinha, báquica talvez… 

Artística e graficamente admirável, este ex-líbris merece apresentação nestas páginas com …«autorização prévia» do director do Museu do Vinho: Biscoitos, Ilha Terceira, Açores, Luís Brum, e – claro está – de quem mais sabe de ex-librismo por estes lados.

Ao aproveitar Barcelona e ao ir por livrarias complementar o giro de cidade como essa, pois, então, esse encontro (ainda de tinta impressora fresca) de obra como a de Francesc Orenes que, embora no catalão discrepante do castelhano, se vai entendendo ou… procurando entender. Pôr os olhos nos ex-líbris deste belo livro reproduzidos, folha a folha, já isso contenta.

* Escritor e técnico superior principal aposentado, da BPARAH
In Revista Verdelho nº 5 – ano 2000