quinta-feira, 25 de agosto de 2011

Falando de Vinho e de Saúde (4)


Por: Jack Masquelier

O LADO ESCONDIDO DO OXIGÉNIO 

Que o oxigénio, conhecido por todos como “o ar vital”, o gás que favorece as combustões e reanima os asfixiados, nos possa ser hostil, isso choca a nossa sensibilidade. E, no entanto, à nossa volta, múltiplos exemplos mostram-nos que a matéria inerte sucumbe muitas vezes à oxidação: o ferro que enferrujem, o óleo que fica rançoso, as roupas que desbotam, o perfume que perde intensidade… Estaríamos nós ao abrigo de tal fatalismo, nós que começamos a envelhecer desde o dia do nascimento? Infelizmente não. Nós partilhamos com as coisas muitas das desgraças da oxidação. Chega até nós da face escondida do oxigénio uma variedade hiper-agressiva desse gás, a sua forma radical. 

DO OXIGÉNIO AOS R.I.C.

Falo agora de um livro saído da minha biblioteca, um tratado de Matéria Médica aparecido no fim do século passado. Tem cem anos e as suas páginas amarelas trazem os estigmas disso. O seu contorno escureceu, a sua proximidade com o ar permitiu ao oxigénio exercer os seus malefícios. Uma experiência muito simples anda-me a tentar: colocar ao sol forte do meio-dia o jornal do dia, dispondo uma zona à sombra, debaixo de um prato, por exemplo. Três horas mais tarde esta zona destaca-se pela brancura do resto do amarelecido do papel. A conjugação Sol+Oxigénio permitiu obter em três horas um envelhecimento quase secular do jornal. A formação de radicais livres oxigenados acelera 300.00 vezes o fenómeno.

Quimicamente, isso inscreve-se deste modo:

Oz…..hv……O2

O oxigénio molecular O2, o que nós respiramos, activado pela energia dos fotons solares hv, transforma-se parcialmente em O2:

Este radical, o primeiro que nasceu da família dos R.L.O. vai engendrar numerosos radicais mais agressivos do que ele. Apesar da sua breve existência (mede-se em micro segundos) os R.L.O. exercem as suas destruições graças à sua expansão o que evoca a reacção em cadeia de tipo nuclear. Como é de esperar, a nossa constituição corporal resiste a muito custo a esse tipo de agressão. O cologénio do tecido cutâneo degrada-se. Vê-se o resultado disso no rosto das pessoas que vivem em altitude. 

OS R.L.O. ENDÓGENOS

Se os R.L.O. só se formassem ao sol, o mal seria evitável: um guarda-sol, filtros para U.V. bastariam. Infelizmente, eles nascem também no nosso organismo, onde a sua presença é, por vezes, indispensável. Pensa-se que 2 a 5% do oxigénio que respiramos produz R.L.O.. O seu papel pouco famoso consiste em queimar nas células os resíduos que ficam da depuração pelo oxigénio banal. A sua aplicação ao trabalho leva-os a destruir não somente esses resíduos, mas também o que os envolve.

O álcool perfila-se entre as substâncias votadas à acção radical. Bebido em dose moderada, a sua depuração põe a funcionar a enzima hepático A.D.H. previsto para esse efeito. Consumido em excesso, o álcool ultrapassa as possibilidades do A.D.H. e, desde então, os R.L.O. entram em jogo. Uma boa parte das perturbações e lesões orgânicas que outrora se imputavam ao álcool devem-se na realidade à invasão radical.
 Nos tecidos vivos, os lípidos constituem um alvo de escolha para os R.L.O., com preferência marcada para os ácidos gordos poli-insaturados (A.G.P.I.) componentes essenciais das paredes celulares. 

A membrana, longe de ser uma parede protectora intransponível, exerce na célula múltiplas funções fisiológicas. Ela dirige o transporte activo das moléculas que, por necessidade vital, entram no citoplasma ou saem dele.

A expressão de identidade imunitária, o reconhecimento da sua identidade incumbem-lhe igualmente.  

Tudo isso exige a manutenção permanente de um estado fluído, tornado possível por uma taxa elevada de A.G.P.I. Sabe-se que a membrana mostra aí o seu ponto fraco. Com efeito, todo o excesso de R.L.O. provoca a peroxidação dos seus ácidos gordos, a sua destruição seguida do endurecimento local da parede arrastando a sua incapacidade funcional. O exemplo das membranas celulares ilustra o efeito do envelhecimento acelerado próprio dos R.L.O. Adivinhámo-lo à base dos grandes síndromas de degenerescência que atingem nos nossos tempos as populações das nações evoluídas. Nelas o crescimento de esperança de vida assegura aos R.L.O. uma “ceifa” abundante de indivíduos sem defesa.

AS PROTECÇÕES NATURAIS

Se a idade avançada deixa o homem carenciado face aos R.L.O., o seu organismo pôde entretanto resistir até ao limite da velhice graças ao sistema de defesas naturais de que estava provido. Trata-se de uma bateria de enzimas tendo por missão conter a produção dos R.L.O. ao nível exigido para a sua missão de depuração celular.

Superóxido, dismutase, glutathion, peroxydase, catálese, tais são os agentes que asseguram a nossa protecção. Duas sombras no quadro: as deficiências genéticas e a idade. A formação das enzimas obedece ao código da A.D.N., e nada assegura que os genes em causa sejam funcionais em cada indivíduo. Além disso, na pessoa idosa, a síntese das proteínas e, portanto, das enzimas é mais lenta e o efeito esperado atenua-se.

Felizmente, existem nos alimentos substâncias dotadas de um forte poder antioxigénico e capazes de atenuar a deficiência das enzimas. São os neutralizantes de radicais livres, como as vitaminas E e c e o betacaroteno.

É condição que esses neutralizantes estejam operacionais quando a reacção radical se instaura; então pode-se confiar na sua eficácia. Um único problema põe-se em função da sua origem exógena: ignora-se se os alimentos os contêm suficientemente e se o nosso organismo pode ainda armazená-los.

Urge portanto mostrar-se vigilante quando, chagada a idade, a necessidade desses captores se torna imperativa.


Continua

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