quinta-feira, 4 de agosto de 2011

O Vinho e a Saúde: Os três paradoxos (2)


Por: Mário Saraiva Pinto

5- Passemos agora ao “paradoxo americano”.

Apesar de os Estados Unidos dispensarem anualmente milhões de dólares em cuidados de saúde, de terem promulgado ferozes restrições anti-tabágicas e de aí proliferarem sofisticados “health-clubs”, todos os anos mais de 500.000 americanos morrem de doenças cardíacas (40% dos quais têm morte como primeiro sintoma). A este número haverá que acrescentar, ainda, o de mais de um milhão de estadunidenses que, cada ano, sofrem enfartes do miocárdio, a eles sobrevivendo, embora muitas vezes irremediavelmente debilitados para o resto das suas vidas.

Razão principal de tal “razia”: o argumento de que o seu ritmo de vida não lhes deixa tempo para cozinhar, os americanos criou uma gigantesca indústria de “techno-food”, ou seja, de produtos alimentares manufacturados (“comida de plástico”, diríamos nós) cujo uso e abuso é generalizado. Qualquer visitante atento dos estados Unidos pode detectar, visualmente, os seus efeitos: em nenhum outro país do mundo se devem poder encontrar tantos obesos por metro quadrado!


Se bem que haja alguns sinais animadores (por exemplo, após a transmissão de um programa sobre o “paradoxo francês” por uma cadeia televisiva com cobertura nacional, o consumo de vinho tinto e de azeite subiram em flecha), não é previsível uma mudança drástica de hábitos a curto prazo: é que a filosofia de saúde americana está baseada na intervenção e não na prevenção, e isso tem um preço (que, por sinal, e infelizmente, é bem alto, em sentido real e figurado).

Mas o pior é que a febre da “techno-food”, ataca universalmente, e também uma Europa “adormecida” começou a sentir já “arrepios” correspondentes. Com efeito começa a ser vulgar uma família inteira entrar num centro comercial e dirigir-se a um qualquer “mac-restaurante” da respectiva Praça da Comida, onde cada membro come o seu hambúrguer, empurrado por uma inevitável “qualquer cola”. Depois, andam umas dezenas de metros e entram numa sala de cinema, onde acompanham  o filme eleito bebendo uma segunda “cola qualquer” e mastigando ruidosamente pipocas açucaradas…
Será que iremos despertar a tempo?

6- Finalmente, debrucemo-nos sobre o que consideramos ser o “paradoxo português”, sendo Portugal o 8º produtor mundial de Vinho, triste é verificar quão mal tratado é o produto, nomeadamente em termos de imagem, umas vezes por acção e outras por omissão.

a) Por acção, porque todos os dias somos atropelados com mensagens enganosas em que, por ignorância ou má-fé, se confundem, sistematicamente, os malefícios do consumo exagerado de álcool com a ingestão de vinho, “tout court”. Basta ver os “placards” que bordejam as nossas estradas em que, ilustrando a frase “se conduzir, não beba”, aparece um copo de vinho tinto, de onde se depreende que uma gota de sangue da mesma côr. É certo que a Cor da cerveja e das bebidas destiladas não se presta a este tipo, fácil e irresponsável, de fazer associações cromáticas, mas produzir cartazes assim é reprovavelmente anti-ético e demagógico. Além de que, porque alimentam a falta de esclarecimento da maioria da população, é igualmente anti-pedagógico.

b) Por omissão, porque os resultados das pesquisas médico-cientificas (em que de forma clara, como atrás se disse, aparecem plasmados os efeitos positivos do consumo moderado de vinho sobre a preservação e melhoria das condições de saúde humana e a prevenção de várias enfermidades) se limitam a circular nos restritos círculos académicos em que tais estudos se realizam, sem que o grande público a eles tenha acesso, de forma fácil e inteligível.

Continua

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